Pois é, com essa história de livros digitais em alta no mercado, os famosos e-books, pintou uma esperança de que os mesmos fossem acessíveis ao meu leitor de telas.
Para quem não sabe, um software leitor de telas é um programa especificamente desenvolvido como ferramenta de acessibilidade às pessoas com deficiência visual, proporcionando que estas possam utilizar seus computadores da mesma maneira que uma pessoa que enxerga normalmente.
Eu, por exemplo, sou cego e utilizo o computador em casa por meio dessa ferramenta. Posso manejar o Windows normalmente, o pacote Office da mesma maneira, entre outros aplicativos e utilitários presentes no computador e na Internet.
Os livros, desde que estejam gravados em texto digital, podem ser lidos normalmente pelo programa, que por meio de uma síntese de voz, faz a leitura em voz alta do conteúdo das páginas para o usuário.
Com essa expectativa fui até o site da Livraria Cultura, que já anuncia diversos títulos em formato digital, para procurar alguma coisa interessante.
Encontrei o livro “Leite derramado” de Chico Buarque. Interessei-me por ele e resolvi comprá-lo pelo site mesmo. A minha primeira surpresa é que o site da Livraria Cultura não é totalmente acessível, uma pessoa com deficiência visual utilizando um leitor de telas não consegue sozinha concluir a compra. Falta mais respeito aos critérios de acessibilidade normatizados pelo consórcio W3C, que regulamenta a construção de páginas na Internet.
Mesmo assim insisti na compra e com a ajuda de um amigo consegui concluir o intento e aguardei ansiosamente a chegada do livro via email. Eis a minha surpresa quando recebi um arquivo com apenas 1 Kb de tamanho. Fiquei pensando, nossa, como eles compactaram esse livro tanto assim?
A resposta foi que quando abri o arquivo, ali dentro tinha apenas um link, um ponteiro que direcionava o usuário para o servidor da ADOBE nos Estados Unidos. Esse link permitia abrir o arquivo, por meio do programa Adobe Editions que deveria ser instalado na minha máquina.
Cumpri todos os requisitos necessários e ao tentar abrir o livro descobri que ele era apenas uma fotografia do livro impresso. Uma imagem sem absolutamente nenhuma acessibilidade a não ser pelo sentido da visão.
Desabei e notei que os livros digitais oferecidos hoje pelo mercado não tem a menor preocupação com a acessibilidade. Com a segurança sim, para se evitar contrafação, a pirataria, protegendo os direitos autorais, o que não é errado é claro, mas a preocupação com a diversidade dos leitores é nula, não existe.
Nesse sentido fica aqui a nossa certeza de que o movimento pelo livro e leitura acessíveis no Brasil deve continuar até que persista essa situação vergonhosa para um país que ratificou a Convenção da ONU pelos Direitos das pessoas com Deficiência como Emenda Constitucional em 2008.